Uma mesa de bar. Dois amigos que talvez se conheçam há muito tempo, ou apenas estudem ou trabalhem juntos. Uma conversa ainda sóbria, mas já conduzida por dois ou três copos de cerveja.
-Eu não compreendo muito bem esta questão aí que o pessoal fala do existencialismo.
-O de Sartre?
-Por que? Tem mais que um existencialista?
-Tem vários. O próprio Heidegger é existencialista, na sua forma de ser o “ser”.
-Profundo, hein?
-Só lendo o cara para saber.
-Mas eu queria saber de Sartre mesmo. Por que se deus não existe, então porque somos responsáveis por qualquer coisa?
-Ora, está aí mesmo a questão.
-Como assim?
– Por que se Deus não existe, não há outra pessoa responsável por nossas ações. Então, cada escolha nossa é de responsabilidade da própria pessoa e de mais ninguém. Não tem santo, fenômeno ou Deus que seja para gente culpar.
-Ora, mas se Deus não existe, não temos ninguém para nos reportar…
-E nem para culpar pela nossa vida. Então se você é um sujeito que se deu mal na vida, se fudeu, a responsabilidade é única e exclusivamente sua. Por que você, segundo ele é claro, sempre escolhe, mesmo que escolha não escolher.
-Desta forma parece que cada escolha é um fardo.
-Mais que um fardo, um assassinato…
-Como assim?
-Mais ou menos, é como se fosse aquele filme…
-Qual?
-O Homem Aranha ?
-Mas como o Homem Aranha?
-Ao deixar passar o bandido que rouba o local que ele briga por dinheiro, Peter Parker, ao mesmo tempo, cria as condições do bandido matar seu tio. Sua escolha influi no seu mundo. E mais a frente, quando ele escolhe ser Homem Aranha, ele assume uma série de responsabilidades, além da maior e mais poderosa, a Liberdade. Tal como a frase “grandes poderes, traz grandes responsabilidades”.
-Quem disse isto? Sartre?
-Não o tio do Homem Aranha, qual era o nome dele mesmo?
-Não sei, eu não vejo Homem Aranha, gosto mais duma coisa assim, digamos, menos Holywoodiana.
-Ta ok, não gosta de Homem Aranha mas não saca nada de Sartre…
-Ei, peraí, não é porque eu não entendo de Sartre que eu não possa pensar. Afinal de contas eu sou de teatro, aposto que você não entende necas de Brecht, por exemplo.
-Isto é verdade, o pouco que eu sei é que ele queria atingir as massas, coisas que o Homem Aranha fez muito melhor que ele.
-Ei peraí, mas o Homem Aranha não faz a gente refletir mais do que a Ana Maria Braga no Mais Você .
-Olha, você fica se vangloriando que é do teatro cabeção, mas eu vou te falar uma coisa. Aristófanes era o Zorra Total da Grécia Antiga. Se ele tivesse vivo hoje, iria querer mesmo é escrever para televisão. Aliás, digo mais, Platão, Goethe e Nietszche iam para o teatro porque ele era televisão da época. Os Doze Trabalhos de Hércules está mais para o Missão Impossível 3 do que para Ulisses de James Joyce.
-Fala sério, você ta viajando. Os gregos pensavam sobre as coisas mais distintas e criaram a filosofia, a democracia, a Astronomia.
-Ta ok, se você não quer acreditar que os caras queriam ver a novela das 8 , pelo menos tem que se render ao fato que eles, bem eles…
-O que agora?
-Ora vai me dizer que você não sabe?
-Do que?
-Ora, eles eram todos homossexuais.
-Ah, pera lá.
-Era, vai me dizer que não eram? Dizem que os Espartanos até incentivavam o amor na tropa, pros caras protegerem o próximo com toda a emoção e carinho.
-Bom, isto pode até ser, mas o conceito era diferente! Não é a mesma coisa.
-E lá homossexualismo é conceito, homossexualismo é quem gosta de Homem, porra!
-Mas os gregos não eram efeminandos, pelo contrário.
-Taí eu sempre achei estes bombados de academia meio espartanos. Vai Esparta!
-Faz o seguinte.
-O Que?
-Vamos pedir a saideira que esta conversa não ta rendendo. Fora que isso é preconceituoso.
-Como não tá rendendo? Se calhar dava até uma crônica, ou um conto… Sei lá.