Em meio ao ambiente absolutamente problemático do Brasil, permito-me alguns excessos consumistas despretensiosos. Outro dia, por exemplo, fui assistir Batman VS Super Homem. Dei sorte de encerrar minhas expectativas com os depoimentos sóbrios de quem se aventurou antes de mim. Seria fatal chegar com esperanças no cinema para ver a película. Como ela foi amenizada com as críticas, até que me diverti.
E hoje com todo o ambiente que se configura politicamente e economicamente, prefiro ir a um debate que divide não apenas ao Brasil, mas todo o mundo dos HQ´s, e ninguém precisa se bater. Os personagens já fazem isso constantemente. Qual é a melhor? Marvel ou DC? No meu novo trabalho, a convivência com alguns nerds me fez recordar da dramaticidade do pleito. Após anos, a dicotomia dos quadrinhos se transportou para a tela do cinema. Desde o primeiro Batman, lá nos anos 90, o cinema vem gradativamente absorvendo o universo dos quadrinhos e oferecendo uma experiência total que eles já não conseguiam oferecer. Os efeitos especiais proporcionaram uma verdadeira imersão nos super poderes que as páginas não conseguiram.
Particularmente meu tempo de quadrinhos foi curto, para falar a verdade migrei rapidamente para a literatura. Li muitas poucas hq´s, sobras do armário do meu irmão, que acabei podendo usufruir junto com as Playboys e as Sexys. As que eu mais gostava eram as dos X-Men, que de forma assertiva refletiam as dificuldades de um adolescente como eu, que queria se sentir parte da turma e, ao mesmo tempo, achava-se dotado de grandes poderes que não lhe valiam de nada, afinal seus vilões eram de modo geral infinitamente superiores. Além disso, os personagens exibiam complexidades humanas demasiadamente humanas, o que antagonizava com os heróis da DC. Estamos falando de heróis que tangenciam as divindades. Algo que Tarantino sintetizou muito bem no diálogo do Kill Bill:
“Todo mito de super-herói tem o herói e seu alter ego. Batman é Bruce Wayne. O Homem-Aranha é Peter Parker. Quando acorda pela manhã ele é Peter Parker. Ele precisa pôr um uniforme para virar o Homem-Aranha. E é aí que o Super-Homem se diferencia dos demais. O Super-Homem não virou Super-Homem. Ele nasceu o Super-Homem. Quando ele acorda de manhã ele é o Super-Homem. O alter ego dele é o Clark Kent. Seu uniforme com o “S” vermelho é o cobertor no qual os Kent enrolaram o bebê quando o acharam. Essa é a roupa dele. O que Kent usa, os óculos, o terno, este é o disfarce que o Super-Homem usa para se passar por um de nós. Clark Kent é como o Super-Homem nos vê. E quais são as características de Clark Kent? Ele é fraco, inseguro e covarde. Clark Kent é uma crítica do Super-Homem à raça humana.”
Pois bem, Super Homem finge ser uma pessoa normal, enquanto os heróis da Marvel, em geral, se esforçam para serem super. Não à toa, o herói mais empolgante da DC é justamente aquele que não tem super poderes. Sua superação é ser um super sem ser, afinal o principal ingrediente de uma narrativa é o conflito. Está aí porque Batman é sem dúvida, o melhor herói de quadrinhos. Além de superar adversários demoníacos, tem que superar seus próprios dilemas existenciais. Desta forma, chego num veredito, se o melhor herói é Batman, da DC, a Marvel ganha do adversário pelo conjunto da obra. X-Men, Homem Aranha, Dr. Estranho, Demolidor, Deadpool e tantos outros heróis complexos, divertidos e humanos, demasiadamente humanos.
Além disso, creio que há uma diferença fundamental entre os heróis de ambas as franquias. Falamos de uma concepção política, enquanto na Marvel frequentemente é abordado o empoderamento de minorias e a superação de um Estado opressor, na DC os heróis são superpoderosos absolutos que, por sorte da sociedade, são engajados em salvar um Estado falido e, em certo sentido, representar um poder soberano. Há uma diferença entre um Estado opressor e outro falido, enquanto um demonstra seu poder, como frequentemente ocorre nos X-Men, outro simplesmente não tem o que fazer. Não à toa, os heróis mais empolgantes da Marvel são os que fugiram deste dilema que, no fundo, é derivado da Guerra Fria, quando era necessário frisar uma suposta superioridade americana frente ao comunismo.
Mais que isso, a Marvel inaugurou o conceito de anti-heróis nos quadrinhos, começando com Hulk e Homem de Ferro, até o ponto de criar um Deadpool. Os conflitos dos heróis são frequentemente mais complexos e dramáticos. Com exceção, é claro, do Batman que é uma prova que o DC costuma atuar por meio de clichês. O que é o Batman senão um clichê executado primorosamente? Um órfão extremamente rico que resolve se dedicar a lutar contra o crime quando perde sua mãe. Renuncia uma vida de riqueza pela luta ao crime organizado. Uma prova incontestável que, no fundo, o clichê sempre será uma excelente ferramenta narrativa.
Vejamos quantos órfãos continuam a salvar o mundo desde Jesus? Inúmeros. Nenhum melhor, porém, que o próprio Batman, um Homem que se torna noturno, justiceiro, morcego.
Então, entre Marvel e DC, fico com… o Batman, afinal você sempre deve ser a si mesmo, a não ser, é claro, que você possa ser o Batman.
2 Comentários. Deixe novo
Este meu amigo Bogado sempre me conduz a uma reflexão! Parabéns pelo texto!
Vlw Marcos,
Tks a lot. https://literaturacotidiana.wordpress.com/wp-admin/edit-comments.php#comments-form