

O terror é uma faceta das emoções do ser humano e está conectada diretamente com o medo da morte. Porém, representa uma transcendência, é muito mais que isso. Pois a morte, em si, a consciência dela a transforma de diferentes maneiras, algumas surpreendentemente se tornam o paraíso. A grande questão mora nessa transformação. Se morrer dignamente torna minha morte feliz, morrer de forma “desgraçada”, pelo contrário, torna tudo traumático de uma forma indescritível.
O medo tem um lado primário, alcança nossos sentimentos mais antigos, porém ele não é puramente animal. Ele tem narrativas que se transformam ao longo do tempo. E se o terror do século XX teve como sua essência o vampiro e o pesadelo do indíviduo, o século XXI é a perda maior que o individuo no seu intimo pode viver de um dia para o outro- A catástrofe.
E se eu não pagar as contas? Se eu for mandado embora? Se acontecer algo comigo repentinamente que acabe com minha vida? Se eu virar zumbi? Sim, o terror é muito além do medo da morte, é o medo da desgraça. Por esta mesma razão o terror se transformou e se transforma continuamente ao longo da história. Dificil fazer uma retrospectiva fiel de toda a linha do tempo do terror – e isso sem dúvida seria um excelente assunto. Mas podemos recordar uma breve transição entre o terror individual e um certo terror coletivo nas últimas décadas.
Enquanto os filmes de terror anteriores estavam de forma geral preocupados com um valor maior – a luta entre o bem e o mal – e frequentemente o que isso significava num âmbito individual , seja por meio de vampiros, exorcismos, franksteins ou outras manifestações de um mal superior; o terror do século XXI é sintetizado pela banalidade. O terror dos apocalipses sucessivos que Hollywood proporciona para a humanidade é sem qualquer significado e, claro, o apocalipse zumbi é o mais emblemático deles.
A vulgaridade da catástrofe se tornou comum, ridícula e cotidiana, tão habitual que a autora inglesa Caryl Churchill consegue traduzir isso de uma forma esplendorosa. Sua solução dramatúrgica foi colocar quatro senhoras, quiçá como ela, tomando chá e narrando suas catástrofes num ambiente que tangencia o distópico mas que nunca se revela totalmente. Poderia ser apenas um entardecer de chá de velhas amigas. Nos intervalos, as catástrofes são narradas como que conduzindo a história de cada uma delas fazendo com que elas mesmas sejam expressões dessa grande catástrofe da nossa narrativa cotidiana – o indivíduo. Creio que entendi, no fundo, a grande catástrofe na própria catástrofe é o individuo.
O espetáculo Chá com Catástrofe está atualmente em cartaz no Centro Cultural São Paulo é um resumo desse mundo, que tangencia a nossa realidade. Nossas pequenas catástrofes e que podem ser vivenciadas de forma banal – como quatro senhoras tomando chá de tarde e, de alguma forma, revelando suas próprias catástrofes pessoais entre as grandes tragédias da humanidade.
Chá e Catástrofe
De 5/04 a 15/05
sextas e sábados, às 21h, e domingos, às 20h – 50min – 14 anos – Sala Jardel Filho
R$20,00 – a venda estará disponível na bilheteria em seu horário de funcionamento (terça a sábado, das 13h às 21h30, e domingos, das 13h às 20h30).