

Um lapso de memória fez com que eu levasse para casa emprestado de um amigo um livro de Rubem Alves e não o Braga, um dos maiores cronistas reconhecidos de nossa língua, o que seria uma lição para mim que me pretendo artífice dessa letra. Porém, o equivoco acabou me presenteando com outras palavras, as do Alves.
O livro Ostra Feliz Não Faz Pérola é um passatempo gostoso. Se crônicas tem a delícia de poderem ser degustadas com o frescor do momento, mesmo que durante anos a fio, os pensamentos de Rubem Alves compilados nesse livro oferecem a possibilidade de serem apreciadas no seu tempo, seja como uma pequena grande epifania, seja como simplesmente um relato, um de cada vez.
Em tempos de redes sociais, este compilado lembram um perfil do twitter, com seus posts e “threads” ainda que muitas vezes não se limitem aos tais números de caracteres. São pensamentos sobre assuntos diversos que frequentemente encontramos nesses canais e que lidos como um todo, acabam formando uma linha temporal, um pensamento. O que distinguiria Rubem Alves e seu livro de uma boa seleção, ou curadoria, de uma rede social? Bom, temos uma edição que organiza por temas, a disposição a superfície do papel que realiza uma edição por si só. Mas, arrisco a dizer que o que o distingue, está muito mais na sua essência, do que propriamente na plataforma. E isto poderia ter mudado, mas o fato é que Rubem Alves como era, junto ao que ele foi, permitiu a ele naquele dado momento se expressar de uma forma simples, rápida, pequena e, possivelmente, mais extensa do que os 144 caracteres. Ainda que use os mesmos!
Não é novidade a maneira curta de se expressar: frases, piadas, axiomas, aforismos, haikais, contos curtos, slogans, propagandas dentre outras tantas, sempre exigiram formas rápidas de apresentar o ponto. As redes sociais apenas popularizaram e, de alguma forma, tiraram um pouco o glamour daqueles que faziam com excelência o exercícico. Prática essa que tinha o ritmo das reflexões da época, mais lento, sincopado, do jeito que encontramos em Rubem Alves. Por isso mesmo, prazeroso de ler e, ao mesmo tempo, completamente distinto de ler posts , tweets e comentários em uma rede social qualquer.
Uma edição poderia reverter esse quadro? Possível, mas antes deveria se vasculhar todos os comentários dessas diversas pessoas que tivessem esse ritmo em um algoritmo poderoso – descompromissado, meio disperso, quase contemplativo que Rubem Alves teve naquele momento. Uma encruzilhada casuística determinada e que portanto exigiria um bom trabalho de edição, ainda mais se fosse de uma e apenas uma pessoa.
Sendo assim, nem sei se indico. Ostra Feliz Não Faz Pérola não é exatamente um livro de se ler, assim como aqueles de uma vez só. Tampouco é necessário ler inteiro – mas eu estou quase lendo. O prazeroso, no entanto, é talvez trocar a leitura cotidiana das redes – cada vez mais escatológica – por pensamentos e frases mais elevadas.
Que tal?