Foram duas horas de missa em uma igreja que não é pequena abarrotada de gente em todos os bancos, nos corredores ao fundo, na entrada… lembro pouco além do meu padrinho de batismo, então de crisma, reclamando de sentar “no pau duro” do banco de madeira da igreja.
Naquele tempo eu acreditava nas pessoas religiosas como se fossem diferentes das outras, imaculadas talvez. É, eu tinha ainda a inocência possível a um garoto de 14 anos em meados dos anos 1990. Credulidade deve ser uma palavra melhor que inocência, eu era crédulo em relação às pessoas, às mais velhas, às religiosas, em relação ao futuro, à humanidade, ao progresso, ao “país do futuro”…
Cheguei a imaginar como seria ser padre – cruzes! – numa conversa com um amigo meu quando ele me revelou que pensara nisso seriamente durante o nosso “catecumenato crismal”. Aliás esse amigo estava ao meu lado durante as duas horas daquela celebração com a mãe de outro amigo nosso como madrinha, cujo filho tinha como madrinha a mãe daquele, também no mesmo banco. Confuso? Mãe de um madrinha do outro e vice-versa.
E é de uma rápida conversa em meio àquelas duas horas que me recordo. A madrinha ao meu lado comentava algo com a outra (em cima de uma fala do Bispo que celebrava a missa em sua homilia instando os crismandos a serem boas pessoas, fazerem o bem, por um mundo melhor…) a respeito da geração delas ter feito um bom trabalho e que esperava o mesmo de nós – confesso, essa memória que me veio hoje data de quase 25 anos atrás, podem não ter sido exatamente essas palavras, contudo era esse o teor.
Prontamente, no auge da minha crescente arrogância adolescente adocicada por altiva ingenuidade – avalio hoje – atalhei:
– Não! A gente vai fazer melhor!
Provavelmente elas fizeram aquela feição que fica entre o “uau!” e o “faz-me rir”, ou algo entre o “que otimismo bacana!” e o “sabe de nada, inocente!”. “Só o tempo dirá”.
E disse.
“Nada como um dia após o outro”.
E disse meio como uma triste revelação hoje.
“O mundo dá voltas…”
Decepção. Porque, convenhamos, olhem o cenário que temos (aliás antes fosse um cenário…). O século do futuro, os anos dois mil, e, no entanto, o Brasil de 2020 é uma mistura do que há de pior entre a década de 1930 e a de 1960… e aquela minha credulidade é diariamente posta à prova. Não que eu veja o mundo como um moleque, claro, mas precisava tanto? Aquele arroubo juvenil é sensivelmente substituído pela rotina neurótica da sobrevivência pequeno burguesa.
Só que não foi “só” isso…
E aí realizei: fazer melhor? Não. Que dureza! Muito pelo contrário, fizemos pior, muito pior, desumanamente pior… 57 milhões de brasileiros, dentre eles, amigos de infância, familiares, pessoas de quem gostamos elegeram o fake-Messias – além dos que não se arrependeram e ainda o apoiam – e contribuem todos os dias para matar qualquer resíduo daquela credulidade dos meus catorze anos.
Sim, falhamos como geração, não demos o devido valor a tudo aquilo que, na prática, crescemos achando que estivesse ali como um “cenário” antigo ou permanente ou estabilizado como liberdade, democracia, estado de direito, Eco-92, moeda forte, crescentes igualdade de direitos, acessibilidade, ascensão social… o país do futuro se presentificando.
Recorro àquele ditado alemão que diz: se há dez pessoas sentadas numa mesa e um nazista chega e se senta, se nenhuma pessoa se levantar, então temos onze nazistas.
Desculpa, Flávio Migliaccio, Lima Duarte, madrinhas e tantos outros…
Alguns sacramentos depois, de alguma forma deixamos o ódio, o machismo e a masculinidade frágil, a homo e a transfobia, o racismo, o preconceito de classe, a perversidade, a criminalidade, a eugenia, o desvalorização da vida, em síntese, a desumanidade em suas várias vertentes e facetas figurada no atual presidente, sua família e seus asseclas alcançarem o poder, rebaixando o mais alto cargo do poder executivo brasileiro e o povo brasileiro por extensão, e a nós, e a mim…
Fracasso!
Tomei pau!
O sentimento é esse, não há mais o que dizer…
Paulo Roberto Laubé
8 Comentários. Deixe novo
Parabéns, Paulo! Vc consegue avaliar então o sentimento/sensação de quem tem algumas décadas a mais de idade? Que viveu mais sonhos e ….?
Espero que as coisas melhorem…
Muito bom!
Obrigado!
Eu tenho 23 anos e soube que Jesus fez seu primeiro milagre nesta msm idade.
Ver um educador narrar tamanha amargura doi meu peito, mas venho dizer que enquanto haver a vida haverá esperança! Como a Cris do SNJ canta tão lindamente, ainda ha tempo para a mudança e ainda há esperança! Então não se desculpe pois suas desculpas sao sinônimo de desistência e isso eu não aceito sabendo da promessa feita diante de Deus e de seus semelhantes! Sendo assim eu não aceito as desculpas e nem a desistenciazinha perante a luta!! A promessa feita la atrás vale exatamente para os dias de hoje e si eu por meio desta resgatar alguma esperança no coração de quem estiver lendo, mesmo que uma fagulha apenas já sera o suficiente para alastra o fogo que aquecera nosso espírito! E si de alguma forma eu tocar um coração desmotivado pra mim já conta como um milagre! Não meu, mas nosso!!!
Obrigado pela força , Dimas, seguimos na luta! Mas que dá um desânimo, dá…
Já vai preparando um “Failure 2023”, este sim promete ser bem pior.
PS: 2023 será um novo mandato
Já vai preparando um “Failure 2023”, este sim promete ser bem pior.
PS: 2023 será um novo mandato