Livremente inspirado em Racionais MC’s, parafraseando “Diário de um detento” (do álbum SOBREVIVENDO NO INFERNO de 1997) e refletindo um pouco as efemérides de novembro…
15 de novembro
Proclamação da República
Das aulas de latim eu me lembro
Essa data esconde duas vezes a mesma palavra
Proclamar é anunciar em público
República é a coisa pública
Ou seja, anunciar ao povo
Aquilo que é do povo.
No entanto a queda do Império
Tinha um quê de deletério
Antes de comemorar
Devemos rememorar
Que foi uma espécie de golpe militar
Não sabemos como é se rebelar
Com a cabeça e disciplina de um militar
Doutrina de campanha ou de papel
Confunde muito soldado em um quartel.
.
Mas o Deodoro, Marechal
Tinha boas intenções, normal
Sabe o que a elite deseja
Sabe o que ela respeita
Será que os fazendeiros engoliram a abolição?
Será que os herdeiros permitiriam a proclamação?
Tardiamente um ano atrás
Finalmente escravidão: aqui jaz
Infelizmente depois de cento e trinta anos
Conscientemente o dia vinte, os manos
E minas ainda sofrem muito preconceito
Em qualquer república isso não é direito
O que é consciência negra?
.
Manda um recado a nossa bandeira
Em teu seio retratas a verdura dessas matas
Este céu de puríssimo azul
E o esplendor do Cruzeiro do Sul
Muitas cores forjaram a nossa bandeira
Muitos valores formaram a nossa cultura
Monarquia é monarquia
República é república
Ditadura é diferente, né?
Tira direito toda hora, sequestra, tortura, frustra…
Não, isso será no tempo de um tal… menos brilhante
Aliás, esse tema não dá pé,
Mas vira e mexe volta à moda, é…
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Cada momento, um herói, uma solução
Cada evento, uma revolução
Cada revolução, uma bandeira, “um motivo, uma história
De lágrima, sangue, vidas e glórias
Abandono, miséria, ódio, sofrimento
Desprezo, desilusão, ação do tempo”
Conduzida mais entre bacanas, triste…
Pronto: eis um novo regime!
Lamentos no interior, nas favelas, no centro
Com quem é do campo, em todos os cantos
A gente conhece o sistema
“Aqui não tem santo”
Nossa bandeira nacional emerge
Pra lembrar o que o país perde
.
Dia da Bandeira é novembro dezenove
Tic tac ainda século dezenove
As mudanças no país andam em câmera lenta
E às vezes apenas tenta…
Partido tomar, uma Velha vai passar
Com cidadão de bem, proprietários, católicos…
As mulheres também são esquecidas
Só em trinta e quatro viram sufragistas
Fascismo versus liberalismo
Integralistas versus comunistas
O Estado Novo é uma ditadura
A Era Vargas perdura.
As leis de trabalho consolida
“Pai dos pobres, mãe dos ricos”
E ainda tem a força expedicionária
Segunda Guerra Mundial sanguinária
Submarinos no nosso litoral
Greens go for all!
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Tudo acaba em quarenta e cinco
Um militar de novo no recinto
Do rádio surgem rainhas e paetês
“Bota o retrato do velho outra vez…”
E o Getúlio volta ao poder
Para com tiro próprio morrer
Mas 50 anos em cinco
É o lema de Juscelino
Não apaga o Maracanaço
Mas avança a capital ao cerrado
A um custo muito alto
Corrupção prejudica nosso saldo
A coisa pública sempre seletiva
Uma república nunca coletiva
Mas varre varre, vassourinha
A ideia da limpeza fascina
Fascina e naufraga
Jânio renuncia, Jango não emplaca
Homens de farda contra legalistas
Suspeitas, disputas, planos trienais
A inflação sempre a pedir mais
Mas os militares tinham medo do vermelho
Mundo bipolar, Guerra Fria, americanos no meio
Mais um golpe militar!
Ou movimento alguns querem chamar…
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Eis um novo regime…
A coisa pública sem público
Quem não ama o time,
Deixe-o.
Mas a seleção…
O Brasil foi tricampeão
Se não é o futebol do povo talvez um ópio?
Somos demais
Tenta-se disfarçar os atos institucionais
Mas o povo enfrenta “anos de chumbo”
Sem saber que “apesar de você”
Há de haver outro mundo…
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Mas o processo é lento,
É preciso esperar o momento
Nada de “quem sabe faz a hora”
As mudanças sempre ocorrem com a massa de fora
Lenta, gradual e segura, foi a nossa abertura
Mas até hoje tem quem defenda a linha dura
Pluripartidarismo, malufismo
Redemocratização
Alguma coisa acontece no coração
O brasileiro quer votar
Quer da coisa pública participar
E em menos de dez anos do fim da ditadura militar
Perdemos o presidente indireto
Aceitamos o arranjo com o vice predileto
Dos que compartilham a velha, a nova
Os poderosos seletos
Tivemos uma nova Constituição
Das mais humanas e modernas até então
Elegemos um presidente contra marajás
Que em seguida conseguimos tirar
Elegemos o professor intelectual
Patrono do Plano Real
Elegemos o proletário
E o povo se sentia mais signatário
Não fossem os grandes beneficiários
Banqueiros e empresários
Elegemos até uma mulher
E quando se pensava que não haveria mais manobras
Eis que surgem novas obras
Outro golpe, ao estilo paraguaio
O que era mesmo o 13 de maio?
E as forças de segurança e a polícia
Se misturam no judiciário e milícias:
O voto leva ao poder o fake Nero
governado pelo centrão e baixo clero
E nossa república dita de bananas
Continua branca e de bacanas
Em nosso país vermelho como brasa
deveria ter a bandeira vermelho sangue
Tanto a miséria quanto a política no Brasil
São conceitos hereditários
Em que a coisa pública deixa de ter o povo de direito como mandatário.
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15 de novembro uma proclamação
1 Comentário. Deixe novo
Maravilhoso! Muito orgulho em ser sua tia!