Estava passando ao longo do monitor e, de repente, cruzei com uma página em branco. Foi aterrorizante. Ela estava à espreita, pronta para me assaltar tudo o que tenho. Porém, nada tinha em mãos a lhe oferecer: nenhuma história, frase, sequer palavra, nada. Estou vazio, tal como este parágrafo, que não diz nada além da angústia de não ter nada a oferecer ao seu algoz.
Sempre dizem que o pior é não ter nada a entregar ao ladrão. A página em branco clama por seu soldo, e é implacável. A inutilidade pode ser fatal, pode até levar a um confronto desleal.
“Passa agora todos os seus pensamentos”
Ela é medonha. Tem um aspecto hediondo e uma ausência profunda. Nada pode sobreviver a sua ameaça. Ela começa a me arrancar os pensamentos. Um a um, os poucos que tenho são tomados à força. Letras caem no chão: 0weropqk´c asdka kslckaldkasçdaxbhykjtud dfsdf dfsaqww rx.
Levanto-me, após catar minhas armas caídas no piso. O adversário dá alguns momentos de trégua. Estou em guarda. Em qualquer luta há sempre uma pequena probabilidade de vitória. Desfiro um pensamento à direita, um axioma à esquerda. Após uma série de golpes, a página parece combalida com metade de sua disposição inicial. Talvez eu tenha alguma chance.
Ela revida, porém, e ainda tem cerca de quinze linhas de resistência. Sua maior arma é o seu vazio. Ela reflete o meu terror, como um espelho, paralisa, como uma medusa. Acho que preciso de um parágrafo para respirar.
A folha em branco me venceu, mas lutei bravamente. Nela, está escrito em cada letra, em cada palavra, o valor da minha luta. Perdi a batalha, mas não a guerra. Em breve, nos encontramos novamente, eu e a folha em branco, em uma nova página.